terça-feira, 11 de outubro de 2011

O celular e o professor




O uso do aparelho celular durante as aulas configura-se um ato de indisciplina. É proibido por lei. Na verdade, nem haveria a necessidade de tal lei, pois se trata de uma regra básica de educação. O pais devem ser responsabilizados por isso, antes de presentear o filho com o celular, ensinar as regras básicas de educação.


Autor: Luiz Antonio Miguel Ferreira [1]
Foi notícia, recentemente, o caso de violência praticada por um aluno contra uma professora, uma vez que a mesma o repreendeu pelo uso de aparelho celular, durante a aula. A professora foi agredida com chutes e agressões na cabeça, por semelhante conduta profissional. Depois de o celular tocar por quatro vezes, ela pegou o aparelho e o levou à diretoria, fato que motivou a agressão por parte do aluno. O adolescente foi suspenso das aulas por três dias e responderá pelo ato infracional praticado perante a Vara da Infância e da Juventude, podendo sofrer uma das medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Pobre professora, agredida, por desempenhar, de maneira exemplar, o seu mister e por fazer cumprir a lei. Sim, porque, no Estado de São Paulo, vigora a Lei nº 12.730, de 11 de outubro de 2007, que foi regulamentada pelo Decreto n. 52.625, de 15 de janeiro de 2008, estabelecendo a proibição, durante o horário das aulas, do uso de telefone celular por alunos das escolas do sistema estadual de ensino.
Na verdade, nem haveria a necessidade de tal lei, pois se trata de uma regra básica de educação, ou seja, não utilizar o aparelho celular durante as aulas, peças de teatros, cinemas, cultos e missas, palestras etc. No entanto, por carência de formação familiar, a lei vem reforçar a necessidade de se cumprir esta norma geral de convivência e disciplina.
A professora agiu dentro da maior legalidade possível. A retirada do aparelho celular, que esta sendo utilizado indevidamente, é um ato necessário e legal para o bom desempenho das atividades docentes. Não há como conciliar-se o desenvolvimento das aulas com o uso do aparelho celular, durante a realização das mesmas. Pode-se, num primeiro momento, retirá-lo e deixá-lo na própria sala de aula, onde o aluno poderá reavê-lo, quando do término das atividades. Em caso de reincidência, pode ser retirado e levado à diretoria, fazendo com que o aluno o retire após todas as aulas. E, na hipótese de continuidade de tal conduta, existe a possibilidade de retirada do aparelho e entrega, pela diretoria, somente a um dos pais ou responsáveis, que tomará, formalmente, ciência da conduta irregular do filho e da necessidade de intervir, para que a mesma não se repita.
O uso do aparelho celular durante as aulas configura-se um ato de indisciplina, que precisa ser devidamente coibido pela direção escolar. Para que isso ocorra, deve a direção da unidade escolar: I – adotar medidas que visem à conscientização dos alunos sobre a interferência do telefone celular nas práticas educativas, prejudicando seu aprendizado e sua socialização; II – disciplinar o uso do telefone celular fora do horário das aulas; III – garantir que os alunos tenham conhecimento da proibição (art. 2º do Decreto Estadual n. 52.625/08). Assim, antes de se tomarem medidas administrativas previstas no regimento escolar, os alunos têm que ter ciência da proibição da utilização do celular durante as aulas e a clareza de que o seu uso prejudica o desenvolvimento das atividades propostas, interferindo, negativamente, no direito à educação, que é garantido a todos.
Por sua vez, os pais, que são co-responsáveis pela efetividade do direito à educação (Constituição Federal, art. 205) e que fornecem o celular aos filhos, devem orientá-los da forma mais adequada de utilizá-los, contribuindo para a sua educação. Neste sentido, além das instruções básicas de como utilizar a tecnologia embutida no aparelho (fotos, redes sociais, mensagens etc.), têm que ser orientados sobre as regras fundamentais e essenciais de convivência de como, onde e quando pode utilizá-lo, no caso, o ambiente escolar. A omissão dos pais autoriza a escola, via professora, a tomar a atitude necessária para banir o uso do aparelho durante as aulas. E, em última hipótese, a conduta dos pais pode configurar uma infração administrativa prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 249), referente ao descumprimento dos deveres decorrentes do poder familiar.
Verifica-se, de todo o contexto, que esta questão se relaciona com a necessidade imperiosa de os pais estabelecerem limites aos filhos. Com efeito, se assim não procederem, outros agentes serão chamados a desempenhar esta função, no caso, a professora, que nada mais fez que impor um limite ao uso indevido do celular. E agora, como decorrência do ocorrido (ato infracional), o Poder Judiciário e o Ministério Público irão intervir, impondo outros limites, que se materializarão nas medidas socioeducativas.
O celular chegou a todas as classes sociais e faz parte da vida de crianças e adolescentes. É preciso enfrentar os problemas decorrentes de seu uso e isso requer o comprometimento dos pais, da escola e de todo o sistema de proteção dos direitos da criança e do adolescente, para evitar situações como à noticiada.
[1] Promotor de Justiça, Coordenador da área de Educação do Centro de Apoio Cível do Ministério Público do Estado de São Paulo. Mestre em educação. Autor do livro: O Estatuto da Criança e do Adolescente e o professor (Cortez, 2010). Membro do Conselho Consultivo da Fundação Abrinq
Fonte: http://www.educacao.sp.gov.br/noticias/o-celular-e-o-professor (acesso em 10/10/2011)

quarta-feira, 30 de março de 2011

Conselho de Escola: um dos caminhos para a qualidade - por Douglas Fersan



Certa vez li uma reportagem que apresentava dados sobre o desempenho dos alunos das escolas da Coréia e o autor do texto enfatizava algo interessante: ele relatava que as mães e avós ficavam nas janelas das salas de aula, do lado de fora, observando os filhos e netos enquanto esses desenvolviam suas atividades. O jornalista fazia uma associação entre o bom desempenho desses alunos e a participação ativa da família na vida escolar dos mesmos. Obviamente essa é uma situação extrema, típica de uma cultura peculiar e que não convém importar para a nossa realidade, no entanto, a relação entre a participação direta da família e da comunidade e o sucesso escolar é fato indiscutível.
E vale lembrar que aqui se fala em sucesso escolar e não apenas em boas notas. Essas são resultado direto do sucesso do trabalho desenvolvido pela escola, envolvendo toda a comunidade. As boas notas apenas refletem o sucesso de um processo mais amplo e complexo do que o simples acerto: um processo que envolve a construção de cidadãos plenos e conscientes de seu papel no mundo social, político e profissional. Essa construção é um processo árduo e difícil, que a escola sozinha não consegue garantir sem uma gestão democrática, sem a participação direta em todos os envolvidos e interessados no sucesso do resultado final. Pais, alunos, professores e gestores devem tomar para si essa responsabilidade.
Só é possível entender um microcosmo (nesse caso o aluno) se conhecermos o seu macrocosmo (a sociedade em que vive). E só é possível transformar o microcosmo quando envolvemos o macrocosmo no processo de transformação. O Conselho de Escola é um importante instrumento para o sucesso dos objetivos da escola, mas é preciso, antes de qualquer coisa, garantir que o Conselho seja eficaz e realmente participativo. Não basta existir um Conselho meramente para cumprir trâmites burocráticos, como também sua atuação não deve ser restrita a deliberações sobre assuntos triviais ou administrativos apenas, mas um Conselho que seja realmente atuante, crítico e participativo. A participação do Conselho deve acontecer em todos os níveis: elaboração e aprovação da Proposta Pedagógica, acompanhamento dos problemas escolares, participação nas decisões e busca de soluções e assimilação da consciência cidadã, de que a família presente é um investimento no crescimento ético, moral, pedagógico e profissional dos filhos. No entanto essa não é uma tradição nas nossas escolas, o que nos leva a crer que nosso empenho enquanto educadores e/ou gestores deve ser constante e insistente, mas certamente trará bons frutos, que por sua vez servirão de incentivo para que outros pais venham a participar.
Construir uma escola democrática não é apenas seguir uma orientação dos órgãos superiores da educação. É acreditar no potencial de sua clientela e envolvê-la no processo pedagógico, dividindo a responsabilidade da superação de obstáculos e repartindo os louros da vitória de um sistema educacional realmente eficaz.

Douglas Fersan - Sociólogo e educador - Março de 2011

terça-feira, 1 de março de 2011

Deputado Carlos Gianazzi pede providências contra o DPME e os maus tratos concedidos ao funcionalismo público





Novas denúncias de preconceito se somam às já existentes
e parlamentar exige novamente explicações
professor e deputado Carlos Giannazi encaminhou, no dia 03 de fevereiro, pedidos de convocação do secretário de Gestão Pública e do diretor do Departamento de Perícias Médicas do Estado (DPME) às comissões de Educação e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa. O objetivo deste requerimento é que ambos esclareçam e respondam as novas denúncias de que candidatas ao cargo de professor da rede estadual, apesar de aptidão comprovada, foram vetadas ao trabalho por serem obesas.
A imprensa noticiou esse fato e entrevistou as docentes, que apresentaram farto material documentado no qual exames clínicos não apontavam problemas no exercício das funções, no entanto foram consideradas inaptas e não tiveram acesso aos laudos do DPME, diz a reportagem. Ainda segundo a matéria jornalística, a OAB-SP afirma que, se a dispensa aconteceu por conta da obesidade, trata-se de discriminação e de ato inconstitucional.

“Mais uma vez o DPME é pivô de uma atitude preconceituosa que se soma à outras tantas que vimos denunciando há anos ao Ministério Público Estadual e pedindo investigações, como assédio moral em cima dos servidores públicos, perda de laudos, demora na publicação de resultados, maus tratos com o funcionalismo, entre outros graves problemas. Por tudo isso é urgente que o governo venha à Alesp responder à essas questões e, de fato, resolver os históricos problemas do DPME”, argumenta Giannazi.

O parlamentar apresentou um projeto de lei (PL 338/10) que propõe normas administrativas para humanizar o atendimento no órgão e colhe assinaturas de deputados a fim de instaurar a CPI do DPME.

Extraído do site do Deputado Carlos Giannazi

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Professoras dizem ter sido vetadas por obesidade

Elas foram reprovadas em exame médico de concurso para dar aula no Estado

Ao menos 5 disseram à Folha ter convicção de que exclusão se deve a peso; governo enfatiza que obesidade é doença




TALITA BEDINELLI
DE SÃO PAULO

Candidatas a um cargo de professora da rede estadual paulista afirmam que foram impedidas de assumir o trabalho por serem obesas.
A Folha recebeu reclamações de cinco docentes de três cidades diferentes da Grande SP, que dizem que seus exames clínicos não tinham alteração e, mesmo assim, foram consideradas "inaptas" pelo Departamento de Perícias Médicas de SP.
As professoras participaram do concurso que selecionou 9.304 docentes para dar aulas a partir deste ano.
Elas foram aprovadas em uma prova, participaram de um curso de formação e passaram em uma segunda prova. No começo deste ano, foram submetidas à perícia.
Na semana passada, ouviram dos diretores de escolas onde dariam aula que foram reprovadas no exame.
Elas afirmam que ainda não tiveram acesso ao laudo e que não foram informadas oficialmente do motivo da reprovação. Entraram com recurso e com um pedido de vistas do resultado.
Duas dizem que ouviram dos médicos, no dia da consulta, que provavelmente não seriam aprovadas pela perícia em razão do peso.
Elas têm de 90 kg a 114 kg e duas delas são obesas mórbidas, com IMC (Índice de Massa Corporal) acima de 40.
"O endocrinologista disse que eu não passaria porque estou obesa. Mas meus exames de colesterol, diabetes, eletrocardiograma estão todos bons", afirma Lídia Canuto de Souza, 30, professora de matemática da rede há três anos, como não efetiva.
"Ouvi do médico que eu estava deformando meu corpo e que teria problemas de saúde no futuro. Não tinha uma alteração nos 15 exames que fiz", diz Andréia Pereira, 36, professora de artes.
Uma sexta professora obesa, que ainda não sabe se é considerada apta, diz ter ouvido o mesmo do médico.
Entre os casos ouvidos pela Folha, há o de uma professora de inglês que é concursada na rede há 12 anos. No novo concurso, buscava a possibilidade de dar aulas de português. "Nunca peguei licença por causa do peso, nunca tive problema de saúde", afirma Fátima Fernandes, 41, que diz que já era obesa.
A Secretaria de Gestão Pública, responsável pela perícia, não comentou caso a caso. Disse que "há casos em que a obesidade pode ser considerada doença, segundo os padrões da OMS [Organização Mundial da Saúde]".
A OAB-SP e advogados ouvidos pela Folha afirmam que a exclusão de um candidato por obesidade é considerada discriminação e fere a Constituição Federal.
Endocrinologistas afirmaram que a obesidade não é fator de inaptidão para a função de professor.
"Há um preconceito contra o obeso. Isso não é motivo para ele ser excluído da seleção", diz Marcio Mancine, presidente do departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.

Matéria originalmente publicada na Folha de São Paulo, em 02/02/2011

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Tolerância e passividade - por Douglas Fersan




Muita gente confunde o ato de ser tolerante com ser passivo. Ledo engano.
Ser passivo é assistir as coisas acontecerem e não descruzar os braços. É mostrar-se indiferente diante da dor, da injustiça, da mentira e de tantas outras mazelas éticas e morais que infectam o planeta.
Ser passivo deveria ser crime, pois sabe-se muito bem que a omissão é tão nociva quanto certas atitudes. Calar-se frente uma injustiça é contribuir para que ela continue acontecendo, e isso, de certa forma, tornou-se praxe na sociedade contemporânea. Diz um ditado que “em briga de marido e mulher não se mete a colher”, assim, a quem acredita nessa máxima popular, resta fazer vistas grossas diante de hematomas sociais e ignorar que leis como a “Maria da Penha” tiveram que ser criadas para estancar uma ferida que sangra silenciosa, graças à passividade e à omissão.

Ser tolerante é diferente. É reconhecer o outro, respeitando as diversidades e o direto delas existirem. Ser tolerante não é uma qualidade que deve ser ressaltada naqueles que a tem. Ser tolerante é um dever de todos, pois de todos é, ou deveria ser, o compromisso de construir um mundo mais habitável e ético.

Respeitar a diversidade é abrir a mente para aprender coisas novas, e isso não significa abrir mão das próprias crenças e convicções, mas sim estar preparado para tornar-se um ser intelectualmente melhor, mas nem todos estão preparados para a aventura de sair de sua pequena e ridícula redoma cultural. É mais confortável recolher-se à sua concha e tal qual uma ostra, observar apenas o pequeno universo que seus míopes olhos enxergam, e despejando uma cachoeira de críticas sobre aquilo que não se compreende.
A tolerância deve abranger todos os níveis: social, sexual, racial, religioso, ideológico, e não apenas aqueles setores que mais convém à particularidade de cada um. Essa tolerância é hipócrita. Ser tolerante é, acima de tudo, ser sábio.

Douglas Fersan
Sociólogo, historiador e educador

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Crítica ao livro "O Caderno de David", de Daniel Caldeira - por Douglas Fersan



Conheci o Daniel há bastante tempo, nem sei dizer exatamente quanto. Lembro quando entrei naquela sala de aula pela primeira vez e, com meu jeito meio rabugento de ser, me apresentei àquela turma de sexta série. Lembro perfeitamente do olhar meio assustado do Daniel me analisando e talvez pensando: “taí um professor chato”.
Acredito que consegui mudar essa primeira impressão, pois não demorou muito para que vários alunos daquela classe deixassem de ser alunos para se tornar meus amigos, embora a diferença de idade fosse grande. Lembro de dezenas de alunos que adquiriram uma importância grande em minha vida, sendo até hoje meus amigos, mas não vou citar nenhum, pois o assunto é o Daniel Caldeira, e seria injusto se esquecesse de algum.
Logo percebi que o Daniel era alguém especial. Alguém que nasceu para brilhar, pois era dono de uma personalidade inquieta e crítica: não era daqueles adolescentes que aceitam o mundo ao seu redor sem contestá-lo, como também não era do tipo que sonhava mudar o mundo por pura rebeldia. Tinha os pés no chão, além de maturidade, honestidade e caráter muito além de seu tempo e espaço. É com muito orgulho que me atrevo (e é um atrevimento mesmo) a dizer que contribuí, ainda que de forma mínima para a transformação do pequeno Daniel em um grande Daniel: homem de bem, talentoso e de bom caráter.
É com mais orgulho ainda que recebi, um belo dia, em minha casa, a visita do Daniel, já homem feito, com seu notebook embaixo do braço, dizendo-se empolgado com uma nova idéia.
O domínio da palavra escrita – a ponto de emocionar seus professores – sempre foi um talento do Daniel, mas dessa vez ele tinha um projeto mais ousado, mais abusado até, arrisco dizer. Foi com empolgação que ele mostrou a mim e minha esposa Denise as primeiras páginas de um livro que estava começando a escrever, intitulado “O caderno de David”. Não era um livro qualquer, era um livro já destinado ao sucesso. E o sucesso foi comprovado em seu lançamento, no dia 09 de setembro de 2010, na livraria Nobel, no shopping Frei Caneca, em São Paulo.
Por que tive certeza que já era um livro destinado ao sucesso?
Em primeiro lugar porque era escrito pelo Daniel. Depois, porque tinha conteúdo, intenção e ação.
Não se trata de um livro destinado apenas ao público GLS, embora esse seja o tema central. Trata-se de um convite à reflexão sobre temas como a descoberta interior, a luta pelo reconhecimento da dignidade, os preconceitos, os pré-conceitos, a homofobia e a busca pela felicidade – nem sempre conquistada. É um importante trabalho no sentido de derrubar o estigma do homossexual como uma figura ávida por sexo o tempo todo, promíscua e esdrúxula. Quem ler o livro certamente não será mais o mesmo. A viseira do preconceito dará lugar à reavaliação de conceitos.
A leitura leve, porém consistente e prazerosa, cativa o leitor da primeira à última página e tem o poder de abrir a mente e aprimorar o espírito, embora, com certeza não seja essa a pretensão de Daniel, que tem entre suas tantas qualidades, a humildade.
Raramente indico livros em meus blogs ou matérias publicadas por aí afora, mas acredito que obras como “O Caderno de David” merecem todo o crédito, pois não se trata de simples entretenimento, é um livro que veio para abalar estruturas truculentas e transformar corações. Segue abaixo uma pequena resenha do livro e o link do blog de seu autor, o qual, embora já seja um Mestre, ainda faço questão de chamar de “aluno”, pois essa palavra, oriunda do latim, significa “filho adotivo” ou “aquele que fazemos crescer” (e não “sem luz”, como muitos dizem por aí).







O Caderno de David

Aos 23 anos David morre vítima de um câncer. Deixa aos cuidados da mãe um caderno, com o intuito de ajudar o companheiro a aceitar sua sexualidade. Nele, há pensamentos que discorrem assuntos como homossexualismo, família, religiosidade e amor ao próximo. Léo, ao perder o companheiro, sente-se frágil. É descoberto pela família e humilhado em praça pública. Sai da cidade deixando filhos e emprego. Um ano depois, um grupo de jornalistas descobre uma poesia escrita por ele, destinada a David. Imediatamente pede para que ele retorne, enfrentando a revolta da família. Léo é desafiado a escrever sua própria história. Mas para isso será preciso enfrentar seus próprios preconceitos.

“...tenho um coração colorido...
Que me perdoem os que vivem no mundo preto e branco...”
Daniel Caldeira


Link para o blog do autor: http://ocadernodedavid.blogspot.com/

quarta-feira, 19 de maio de 2010

A escola da impunidade - por Douglas Fersan



Perdeu-se no tempo quem acredita na existência de uma escola destinada a ensinar somente conceitos científicos e normas gramaticais. Não existe mais aquele espaço, tanto físico quanto intelectual, onde os jovens, sentados em suas desconfortáveis carteiras, ouviam atentamente um mestre despejando seu conhecimento para que depois o reproduzissem de forma escrita ou oral. Essa escola não existe mais e, embora os saudosistas vivam lamentando o seu desaparecimento na poeira do tempo, ela é coisa do passado, gostem ou não.
A escola de hoje tem outra missão: a de construir o conhecimento – e aqui não me refiro apenas à teoria construtivista, mas ao sentido mais amplo que o verbo construir pode assumir – e formar cidadãos completos.
A dinâmica social do final do século XX e início do XXI é outra. A mulher não é mais o ser passivo, que ficava em casa à espera do marido e cuidando apenas dos afazeres domésticos e da educação dos filhos. A nova face da sociedade exige da mulher um papel economicamente ativo, o que a obriga a ficar menos tempo com os filhos. E esse pensamento não diz respeito apenas à mulher, mas à família como um todo. A participação da família no processo de socialização do indivíduo é menor hoje do que há décadas atrás.
A tarefa de transmitir valores foi transferida para a escola – outro importante agente de socialização, porém com novas características. Assim, não existe mais o professor, o transmissor de informações. Hoje existe o educador, e o profissional da educação que não aceita essa situação perdeu o trem da história. Educar não é apenas compartilhar conhecimentos. Educar é trabalhar arduamente na formação ética, moral e intelectual do educando, transformando-o de indivíduo em cidadão.
É certo que a maioria dos educadores estão cientes da amplitude de sua tarefa, mas até que ponto existem condições legais para o sucesso dessa empreitada?
Sem cair no velho discurso da inversão ou ausência de valores imposta pela sociedade e pela mídia, sabemos que nossas mãos estão atadas quando a tarefa é estabelecer limites – os limites do bom senso, do respeito ao próximo e da civilidade. Não se trata também do velho discurso que enfatiza as punições como forma de doutrinar a criança e o jovem; mais uma vez é importante lembrar que as coisas mudaram e que já não se acredita na eficiência de tais métodos, porém é preocupante o que se vê nas escolas.
É o grande dilema em que se encontram os educadores, vítimas de um sistema que prega a impunidade. Nem mesmo um sistema de “meritocracia” é possível aplicar, já que o sistema de progressão continuada foi deturpado até se transformar em promoção automática, em detrimento da qualidade de ensino. As crianças e adolescentes, competitivos por natureza, não encontram estímulo nem mesmo para obter boas notas.
Por outro lado encontramos docentes e gestores completamente perdidos diante de problemas graves que assolam as escolas, como a violência, a ausência de limites e o bullying. Não adianta querer maquiar a situação e dizer que tudo vai bem nas escolas e que essas situações são naturais.
Não são. É estado de patologia total, e o que fazer para contar essa onda nociva que contamina os jovens, se as ações esbarram em legislações que não educam, mas corrompem e transformam a escola numa instituição que não informa nem forma, mas deforma?
Documentos como o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e similares são necessários, mas não podemos deixar que essa necessidade crie jovens isentos do senso de responsabilidade sobre os próprios atos. Há quem diga que nos próprios documentos existem instrumentos sócio-educativos para corrigir falhas e abusos, mas não vivemos no país das maravilhas e sabemos dos entraves que existem para que eles funcionem. Assim, educadores e gestores se tornaram reféns dessas legislações, e os jovens, que deveriam absorver valores e responsabilidades, passam a conviver e a crer na impunidade que impera nas instituições de ensino e, pior ainda, externam esse sentimento para além de seus muros, crendo piamente que nunca nada lhes acontecerá. É quando encontram a dura realidade das ruas, que apesar de tão presente nas escolas, não foi ensinada por elas.
Já passou do momento de refletir e discutir sobre tais questões, não porque se acredita numa política de punições, e sim porque a sociedade espera que a escola forme cidadãos honestos e cientes de seus deveres perante o outro. A civilidade e a responsabilidade civil deveriam ser incluídas nos currículos escolares, como fator de formação de um país digno de se viver.
A escola deve ser o local onde aprendemos e ensinamos a responsabilidade, e não a impunidade.

Douglas Fersan - Sociólogo e Educador.
19/05/2010.