domingo, 27 de dezembro de 2009

O Educador é vítima de sua própria escolha





Tornou-se espécie de lugar comum afirmar que educar exige vocação e é um sacerdócio ou um ato de amor. Provavelmente a afirmação é verdadeira, porém, nos tempos atuais, a questão tornou-se mais profunda.
Não há dúvidas de que o bom educador cumpre a sua tarefa com amor e, justamente por isso, assemelha-se a um sacerdócio. Mas isso basta para a construção de um povo consciente de sua identidade, direitos, deveres, carências e possibilidades? Até onde o educador, com toda a fé que deposita no ato de seu exercício profissional, consegue chegar? Quantas mentes e corações consegue atingir? Quantas almas consegue salvar das trevas profundas do desconhecimento?
Ao buscar respostas para essas questões, o educador corre o risco de deparar-se diante de uma considerável frustração, pois percebe que a tarefa de educar é mais complexa que parece e não se limita a inserir normas gramaticais, datas históricas, fórmulas matemáticas ou conceitos cartográficos nas mentes espalhadas pela desordem de uma sala de aula. Educar significa transformar pedras brutas em diamantes, e ao tomar consciência dessa dura tarefa, o profissional da Educação percebe que a vocação, o amor e o sacerdócio não bastam. Ele precisa também de coragem e persistência, pois é como um guerreiro solitário lutando contra um exército de dificuldades.
Também tornou-se lugar comum afirmar que um país só atinge o desenvolvimento se passar pela valorização da Educação, no entanto essa é uma lição que parece ser esquecida pelos donos e manipuladores do poder, que preferem maquiar situações no lugar de investir em ações concretas. A peça principal no processo de educar, no entanto, fica relegada a um plano secundário: o educador.
Hoje o educador não é mais apenas aquele que transmite conhecimentos (felizmente, pois esse modelo de Educação, além de autoritário, favorecia a poucos privilegiados e suas ideologias); ele desempenha outros tantos papéis: é um intermediário, um mediador, psicólogo improvisado e desempenha o papel de pai ou mãe de seus alunos, pois até mesmo a tarefa da educação familiar lhe foi imposta, como resultado da mudança das características da sociedade, hoje muito mais dinâmica e com a mulher realizando não só a função de mãe, mas também de trabalhadora formal. Não há mais professor, hoje existe o educador, no sentido mais amplo da palavra.
Entretanto, esse profissional é vítima de sua própria escolha. É vítima da importante função que escolheu desempenhar na sociedade. É vítima da violência física (muito freqüente e pouco divulgada pelos meios de comunicação), é vítima de legislações frágeis, unilaterais, que o colocam na berlinda, mas raramente o protegem. É vítima das péssimas condições que lhe são dadas para atingir os objetivos de sua tarefa, mas é vítima também das duras críticas que recebe quando os resultados não são os esperados. É vítima da hipocrisia daqueles que tapam o sol com a peneira e dizem que está tudo bem, quando sabemos que o quadro é desesperador e o futuro incerto. É vítima do estresse, da depressão, da frustração, da síndrome de burnout, da auto piedade, da auto crítica, da fadiga, da tendinite, da insônia e tantos males físicos e psicológicos. É vítima da mídia, que sabe alardear apenas o transtorno que esses profissionais causam ao trânsito quando resolvem protestar por condições mais dignas de trabalho (e nesse caso, lutar por condições dignas significa contribuir para a construção de um país mais digno).
O educador é uma grande vítima. E vítimas não constroem cidadãos, constroem mais vítimas. E vítimas são consumidas por um sistema mentiroso, que engana a todos, que desrespeita os direitos mais básicos do povo: a existência intelectual concreta, isenta de parafernálias e estatísticas subjetivas e mal assimiladas, por serem mal intencionadas e indigestas.
O educador é peça fundamental para a construção de uma nação. Um país que não respeita o profissional da Educação não investe na construção do seu futuro. É um país, mas dificilmente será uma nação.

Douglas Fersan - Dezembro/2009.

Nenhum comentário:

Postar um comentário